Câncer em Idosos – Orientações Práticas para Pacientes e Cuidadores
Se você quer saber a respeito do Câncer em Idosos, o que fazer, como reconhecer, quais são os sintomas, como lidar com o idoso que tem câncer, fique até o final deste artigo que a médica geriatra da Clínica Regenerati, Mara Graziele, especialista em Geriatria, Cuidados Paliativos e Prevenções da Terceira Idade, vai explicar sobre isso hoje.
O que é o Câncer?
O câncer é um termo genérico definido por um amplo grupo de doenças que podem afetar qualquer parte do organismo. Ele caracteriza-se pela multiplicação anormal das células que se estendem além dos seus limites habituais, invadindo tecidos e se propagando até para outros órgãos – quando eles se propagam, no caso, para outros órgãos, é o processo conhecido como metástase.
Câncer e Envelhecimento
O câncer e o envelhecimento estão integralmente relacionados. Apesar de ser uma doença que pode acontecer em todas as idades, é conhecida como a doença do envelhecimento, apresentando grande incidência entre os idosos – cerca de 60% das pessoas diagnosticadas com câncer são idosas; 70% das mortes por câncer acontecem em indivíduos acima de 65 anos.
Então, com o constante crescimento da população e aumento de sua sobrevida, o câncer tem se tornado cada vez mais um problema de saúde pública preocupante, exigindo medidas preventivas e de detecção precoce também como um refinamento da terapia, do tratamento, principalmente no idoso.
Avaliação da Saúde no Idoso
Em geral, como é que vamos avaliar a saúde do idoso para saber se pode ou não ser submetido ao tratamento de câncer? Ou como é que vamos fazer essa detecção precoce?
Porque, no geral, os pacientes idosos são menos tolerantes ao estresse, têm mais comorbidades, às vezes, têm um suporte social e familiar prejudicados, um déficit cognitivo ou são muito frágeis.
E a sobrevida depois do diagnóstico do câncer tende a declinar, diminuir, com o avanço da idade; por quê? O câncer, na maioria deles, o tratamento é não curativo. Existe também, às vezes, na pessoa idosa, uma demora no rastreamento precoce, o diagnóstico é mais tardio.
As cirurgias, normalmente, são de menor porte, porque, geralmente, o idoso tem um risco cardiovascular mais elevado, as doses da quimioterapia ou radioterapia, as sessões, são reduzidas, porque é frágil, tem múltiplas comorbidades, várias doenças.
E também os suportes social e familiar diminuídos vão entrar na avaliação para sabermos diagnosticar, indicar o tratamento mais adequado dentro do quadro clínico do idoso com câncer.
Avaliação Geriátrica Ampla – AGA
Para avaliarmos o paciente idoso, geralmente, usamos Avaliação Geriátrica Ampla, a sigla “AGA”.
Nela, vamos ver a questão da funcionalidade desse paciente. Então, para percebermos, temos que saber o grau de funcionalidade desse idoso: é um idoso funcional, totalmente independente ou precisa de ajuda para o banho, se vestir…?
Tem uma dependência para o que chamamos de atividades instrumentais? Consegue pegar um transporte sozinho? Lida com o dinheiro, prepara seu próprio alimento? Ou é aquele idoso que já não faz mais essas coisas, que geralmente é o filho ou algum familiar que toma a frente dessas funções? Isso já fala a favor de um grau de dependência, conta também no momento da avaliação.
O número de comorbidades: quantas doenças têm além do câncer? Ele é diabético, hipertenso, tem algum grau de insuficiência cardíaca?
As condições socioeconômicas em que está inserido, a renda, o suporte familiar. Esse idoso, mais para frente, quando começar o tratamento, que vai ficar mais debilitado, vai precisar de um cuidador, tudo isso tem um custo. Às vezes, o próprio transporte para ir até às sessões de quimioterapia – tudo isso temos que analisar.
Polifarmácia: sabemos que o idoso pode ter várias comorbidades – diabete, hipertensão – e usar vários medicamentos em seu tratamento, então assim, isso conta também, interação medicamentosa, temos que ver no paciente.
E a nutrição, às vezes, não é aquele idoso emagrecido que é desnutrido, podemos ter também um idoso obeso e ele estar desnutrido.
Tudo isso, essas condições, vão implicar, principalmente, na indicação do tratamento do paciente.
Então, se eu tenho um idoso independente, com a parte cardiovascular boa, sem déficit cognitivo, saudável, se tem uma expectativa de vida maior, não temos nenhuma contraindicação, vamos beneficiar um tratamento com quimioterapia, cirurgia para o paciente.
Se temos um paciente dependente parcial para as atividades, sejam elas instrumentais ou básicas, diárias, de vida, por exemplo, é aquele que não tem mais habilidade de resolver os pagamentos da casa, mas consegue tomar o banho sozinho, vamos indicar: “ok, eu vou acompanhar esse paciente no tratamento, mas, geralmente, se for uma quimioterapia, vai ser uma dose mais reduzida”.
Temos que ver também: “ok, eu vou submetê-lo a um tratamento ou até um rastreio dependendo do câncer? Quanto de benefício, qual é a expectativa de vida que tenho para esse paciente nos próximos cinco anos se fizer o rastreamento ou não fizer? Ou se eu fizer o rastreamento e detectar o câncer“?
E se tenho aquele idoso totalmente dependente, que precisa de ajuda para o banho, que tem uma síndrome demencial… vamos rastrear esse paciente? Vamos, de repente, solicitar uma colonoscopia pensando em uma neoplasia intestinal?
Qual é o real benefício para esse paciente que já é totalmente dependente para as atividades? Temos que analisar, tudo isso vai ser importante tanto para pensarmos em um rastreamento quanto para o tratamento depois que tivermos um diagnóstico do câncer.
Então, tanto para propor rastreamento quanto tratamento, avaliamos a funcionalidade, a cognição, o suporte social do paciente, porque temos que pensar mais a frente: quem é que cuida desse paciente, ele tem filho ou não, tem alguém para ter um suporte tanto físico quanto emocional?
A estimativa de vida que temos para esse paciente: uma coisa é um idoso jovem, 60, 65, 70 anos, totalmente funcional, como já explicamos; outra coisa é um idoso de 95 anos, já bem frágil, mais acamado e dependente.
A história da doença, se foi um câncer detectado precocemente, e o primordial: respeitar a vontade do paciente. Podemos ter: “ai, meu paciente de 70 anos é totalmente funcional, mas tem um histórico talvez de neoplasia intestinal na família e quero fazer uma colonoscopia”. Pensando nisso, “ah, Dra., eu não quero fazer esse exame”. É uma opção.
Ou o idoso que já vem para mim e sabe que tem o diagnóstico de câncer, às vezes até já avançado, e “não quero, não quero me submeter ao tratamento” e como geriatras – até o próprio oncologista entende isso –, temos que dar um suporte para o paciente para fazer a família dele entender que acima de tudo, por mais que tenhamos protocolos de rastreamento, temos que priorizar e respeitar a vontade dele.
Primeiro, se ele quer ser rastreado e segundo, se temos o diagnóstico de câncer, se quer ser submetido àquele tratamento uma vez que sabe dos riscos, dos efeitos colaterais.
Rastreamento
O objetivo em si do rastreamento do câncer no idoso é reduzir a mortalidade a partir de um diagnóstico inicial que temos. Na população geral, no Brasil, temos o câncer: de mama, colorretal, de pulmão, de próstata, de útero.
Mas o que acontece? Temos tudo isso em indivíduos mais jovens, o impacto do rastreamento, principalmente, em indivíduos acima de 70 anos, não temos ainda: os estudos falam a favor de pacientes mais jovens, ou seja, não temos estudos tanto no rastreamento do câncer quanto no tratamento de pessoas acima de 70 anos, então, não sabemos o real benefício.
Por isso, é importante a avaliação geriátrica; por quê? É o geriatra que vai dizer “olha, eu tenho esse idoso de 70 anos que estou trabalhando, é funcional independente e por que não vou rastreá-lo para uma neoplasia intestinal? Solicito uma endoscopia, uma colonoscopia se eu estou vendo que um paciente tem uma expectativa de vida acima de 10 anos, acima de cinco anos, e está funcional e independente agora”?
Então assim, o rastreamento no idoso é individualizado, temos que considerar a saúde dele como um todo, expectativa de vida e, principalmente, os seus valores, porque não adianta, podemos estar com os protocolos dos últimos cinco anos, novos, da Sociedade Brasileira de Gerontologia, de Oncologia, mas, acima de tudo, temos que respeitar os valores do paciente, a autonomia e a vontade dele.
Câncer de Pele não Melanoma
O câncer mais comum no Brasil, tanto para o sexo masculino quanto para o feminino, é o de pele não melanoma.
Por isso, temos campanhas para usar filtro solar, estamos em um país bastante tropical e esse é o tipo de câncer que mais incide na nossa população, principalmente no idoso, o que só reforça a importância também de ter uma avaliação.
E, às vezes, lesões de pele, pequenos sinais que parecem inofensivos, com o passar da idade, vão mudando de coloração e ao fazermos uma biópsia, vemos e damos um diagnóstico de câncer de pele – é o mais comum.
Câncer de Mama
Os de mama na população em geral é o mais comum; e no idoso não vamos rastrear já que a paciente é idosa e porque, geralmente, fazemos o rastreio em pacientes mais jovens?
Novamente, não temos estudos com a população acima de 70 anos e vamos individualizar o rastreio: se tenho uma idosa de 70 anos “muito bem, obrigada”, sim, vamos pedir a mamografia para ela a cada dois anos, anual, a depender se tem algo genético associado.
E sabemos que a sensibilidade da mamografia aumenta com a idade, chegando a 86% entre pacientes de 80, 89 anos, então, não tem porque não rastrearmos essa idosa ativa e funcional.
É diferente, novamente, do idoso acamado, mais frágil. Temos que pesar o risco-benefício, fazer uma avaliação individualizada, de cada paciente, uma Avaliação Geriátrica Ampla.
Câncer de Próstata
No homem acima de 50 anos, os tumores malignos de próstata representam cerca de 30% e a segunda causa de morte por câncer no Brasil no idoso frágil.
E por quê? Em alguns casos, o câncer de próstata é um câncer que quando diagnosticado precocemente, temos bons resultados, mas o que acontece? Às vezes, o homem não procura, não tem um médico que o acompanha e esse diagnóstico é mais tardio.
Geralmente, esse diagnóstico é feito com o idoso já frágil, com 85, 89 anos, e associado a isso tem uma insuficiência cardíaca, uma diabete, outras doenças associadas que o deixam mais frágil. Talvez por isso acreditamos que seja uma das maiores causas de morte por câncer no Brasil.
Tem alguns fatores associados: obesidade, idade avançada, antecedente familiar e, às vezes, até em pacientes negros temos uma incidência bem maior.
E o outro fator também é que geralmente é um câncer mais assintomático, principalmente nas fases iniciais, isso dificulta um pouco o diagnóstico nos pacientes mais jovens. E quando vão ter os sintomas, são irritativos, obstrutivos, que podem até se confundir com infecção urinária. Em estágios mais avançados temos até alterações de cálcio dentro do organismo.
Câncer Colorretal
Cerca de 50% das pessoas acima de 70 anos apresentam câncer colorretal. Novamente, os fatores de risco são idade avançada, antecedente familiar, doenças inflamatórias intestinais. E os sintomas: hematoquezia, alteração no hábito intestinal.
O que vai nos direcionar no rastreamento, diagnóstico, tratamento? Avaliação Geriátrica Ampla, temos que ver a funcionalidade, estudar, quem é esse idoso de 70 anos?
É um idoso frágil ou é funcional e independente? Se for funcional independente, vamos pedir os exames necessários, de imagem, a colonoscopia, para termos esse rastreio e quem sabe dar uma sobrevida maior para o paciente.
Câncer de Pulmão
A média de diagnóstico é feita a partir dos 69 anos, um pouco acima de 40% dos pacientes são acima de 70 anos. E, geralmente, a primeira causa de morte por câncer no mundo.
O tabagismo – o principal fator de risco –, a tosse, dispneia, dor torácica, são alguns sintomas associados. Alguns pacientes apresentam até hemoptise, tosse com um pouco de sangue – isso já em fase talvez mais avançada.
Câncer de Colo do Útero
O câncer de colo do útero que, geralmente, está associado ao câncer de mulheres jovens, novamente, não temos muitos estudos com pacientes acima de 70, 65 anos; não há consensos sobre o benefício acima dessa faixa etária nessas mulheres e temos que estudar a paciente.
Acima de 70 anos, se os três últimos exames, de Papanicolau, estiverem normais, não pedimos mais? Depende, vamos estudar essa paciente, às vezes, eu tenho pacientes com 70 anos que são sexualmente ativas.
Então assim, vamos individualizar novamente o rastreio, associar métodos de imagem. Mas o que dificulta a acurácia é que a vagina da mulher fica um pouco atrófica, isso pode confundir, mas é um diagnóstico.
Em mulheres idosas, ele não é menos agressivo do que nas jovens e, novamente, o tratamento, cirúrgico ou radioterápico, vai ser individualizado.
Conclusão
Ou seja, pessoal, basicamente, o câncer no idoso, desde o rastreamento até o diagnóstico e tratamento, depende da Avaliação Geriátrica Ampla. Por isso, a importância de um geriatra tanto para prevenção quanto para promoção de saúde e o acompanhamento e a determinação do prognóstico do paciente.
Então assim, quem vai determinar, guiar tanto o rastreamento quanto o tratamento do câncer no idoso é o geriatra. Geralmente, o oncologista pode pedir uma avaliação da Oncogeriatria, da Geriatria. Ou se é um paciente que já tem um geriatra para chamar de seu desde sempre, o próprio profissional vai fazer o rastreamento dessas neoplasias.
Espero que tenham gostado, façam comentários, perguntas, sugiram outros assuntos que eu vou ficar feliz de conversarmos sobre outros temas dentro da Geriatria.
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